segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Psicologia - Jung






CARL GUSTAV JUNG


"... A minha vida é a história de um inconsciente que se realizou. Tudo o que nele repousa aspira a tornar-se acontecimento e, a personalidade, por seu lado, quer evoluir a partir de suas condições inconscientes e experimentar-se como totalidade. A fim de descrever esse desenvolvimento, tal como se expressou em mim, não posso servir-me da linguagem científica; não posso me experimentar como um problema científico. O que se é, mediante uma intuição interior e o que o homem parece ser expresso através de um mito. Este último é mais individual e exprime a vida mais exatamente do que o faz a ciência, que trabalha com noções médicas, genéricas demais para umas idéia justa da riqueza múltipla e subjetiva de uma vida individual...".


Esta frase nos mostra o quanto que, a obra e a vida de Jung, é extremamente ecológica, sem frases de efeito e sem invenções que atendem ao consumismo materialista da nossa condição pós-moderna; que tanto nos afasta da realidade por impedir a plenitude da vida natural, buscando um modelo de perfeição que fragmenta o todo de maneira racional e, desta forma, unilateral. Sua obra não é um manual de definições nem um mapa que nos afasta da troca e da dinâmica singular que surge em todas as relações humanas.


A obra de Jung é o registro fiel de sua vida e de suas experiências clínicas, tendo como base o processo empírico relacionando, sempre, aspectos teóricos e práticos. Este universo não pode ser partido sem que todo o "ecossistema" se modifique, devendo assim ser visto e percebido por inteiro.


Jung tenta conceituar, mas não se ocupa em definir e, com coerência e muita consistência, sua obra atende a todas as necessidades do mundo moderno, inclusive das situações extremas e emergenciais.


Para Jung o processo de individuação vai contribuir para que tu te tornes aquilo que tu és. Porém, a persona científica, vestida com as roupas da arrogância do saber, nos afasta deste processo, projetando uma enorme sombra, que se expressa através do capitalismo selvagem. A negação do si mesmo nos induz ao consumo desenfreado, preocupando-nos, muito mais, com a quantidade acumulada de bens, do que com a qualidade potencial de vida. Com isso, substituímos a beleza da natureza, que é dinâmica, viva e diversificada, pela busca de um padrão de perfeição, que só a tecnologia da imagem possibilita, criando assim um novo reino que podemos chamar de reino virtual ou do simulacro. Mas, neste reino, nada é vivo só é esteticamente perfeito, negando o sentido da ética e do humano.


O que Jung busca, com o conceito de individuação, não é a perfeição, mas a realização do ser e a sua plenitude, permitindo o reconhecimento das antinomias e da sombra, que fazem parte da natureza humana, contribuindo para que a vida se torne mais harmoniosa.


Jung tem demonstrado, ao longo de sua obra, o quanto que é humanista, não essencialista e determinista, sempre acreditando no potencial da criatividade humana e no caráter compensatório e auto-regulador do Self. Jung é um empirista, não dogmático, mas extremamente coerente e fiel a seus princípios, suas idéias, seu paradigma e, enfim com sua doxa.


Jung, apesar de trabalhar com os aspectos retrospectivos e causais do passado, volta seu pensamento na direção prospectiva, buscando o sentido e o entendimento das manifestações, sendo assim muito mais finalista do que os mecanicistas que são retrospectivos, por viverem sempre em busca das causas passadas para terem o pseudo "poder" de explicar tudo sem entender nada.


Jung esta sempre valorizando a força do diálogo e a arte da hermenêutica, deixando de ser apenas um hábil ouvinte, pois convida seu cliente para ser um parceiro ativo em todo o processo terapêutico.


Quem conhece a obra juguiana, de forma inteira e profunda, percebe que se trata de uma obra extremamente atual e viável, não sendo necessário buscar nada "novo". Infelizmente, como existem muitos "junguianos" que não conhecem bem o "velho" mas que precisam de resultados em suas práticas diárias, ao invés de reverenciarem-se ao mestre e perceber que ainda existe muito a aprender, preferem buscar conhecimentos superficiais, que só contribuem para denegrir e distorcer um trabalho que é tão eficaz, coerente e ecológico.


Jung sabia que, em todas as pessoas, existe um mecanismo criativo contribuindo para que as transformações aconteçam, chamando-o de função transcendente. Ao afirmar que os seres humanos têm cinco instintos básicos onde, além dos instintos da fome, que garante o sobreviver, do trabalho, para proteger e permitir o crescimento e o da sexualidade, que possibilita a transmissão do estoque genético e a perpetuação da espécie, temos os instintos da reflexão, que exige com que tenhamos uma atitude de indagação sobre tudo que existe, inclusive sobre nós mesmos, e o instinto da criatividade, que estimula com que busquemos uma atitude de superação e transformação frente a nossa existência, justificando assim o porque ninguém consegue ficar satisfeito com uma atitude simplista de manutenção de vida, apenas esperando a morte chegar. Em função destes instintos buscamos novos desafios e, inevitavelmente e conseqüentemente, nos deparamos com adversidades e crises.


“... O segredo do mistério criador, assim como o do livre-arbítrio, é um problema transcendente e não compete à psicologia respondê-lo. Ela pode apenas descrevê-lo. Do mesmo modo, o homem criador também constitui um enigma, cuja solução pode ser proposta de várias maneiras, mas sempre em vão” .
Mais uma frase que comprova quanto que o pensamento de Jung é coerente, primeiro, por aceitar a criatividade humana, demonstrando que não existe um determinismo, sendo assim um humanista. Depois, citando a possibilidade de termos vontades livres, dando valor aos impulsos e movimentos que estão a serviço dos desejos do si mesmo (Self). Ao afirmar sua incapacidade de responder, dentro do método reducionista mecânico, apesar de, empiricamente, poder vivenciar e descrever está aceitando a existência dos aspectos transcendentes e a ocorrência de mistérios, ao longo da existência humana. Com este posicionamento, Jung diverge do essencialismo aristotélico.


Através de suas comprovações empíricas, adquiriu a certeza e o conhecimento de que existe um sentido maior para a vida. Algo mais que nos remete para as atinomias e que permite o surgimento da transcendência, do calor angustiante que alimenta a alma e do sagrado.


Jung gera controvérsias, perguntas como: É um místico ou um cientista? Um psicótico que delira com suas visões ou um pesquisador da alma? Um embusteiro que transforma as coisas "ruins" em experiências, criando filosofia e psicologia com a intenção de ajudar?
Vale lembrar que Jung afirmava que os mitos e as manifestações psicóticas se desenvolvem da mesma forma, ou seja, através de processos inconscientes. Jung não era louco, pois valoriza o Ego, que é, simultaneamente, o centro e a periferia da consciência, afirmando que quanto mais forte o Ego estiver mais potencialidade e possibilidade o indivíduo tem para se desenvolver e crescer.


O Ego, administrador da consciência, é muito importante. Sem ele não pode haver crescimento do Si Mesmo (Self) e a discriminação dos opostos. Um ego fraco vai projetar os conteúdos sombrios do inconsciente, gerando as neuroses, as doenças e as paralisias, pois não poderá dar significado simbólico aos conteúdos que vão surgindo no transcorrer da vida. Desta forma, quanto mais for desenvolvido o psiquismo, possuindo um ego estruturante e não desestruturado ou estruturado e rígido, mais dinâmica e plena será a personalidade.
Jung, mesmo desprendido do rigor cartesiano concreto, era um grande pesquisador, sem jamais abandonar o respeito pela ciência e pela alma humana, dizendo que as idéias de consciente e de inconsciente nasceram juntas. A consciência pensa e percebe o inconsciente, mas sem ele não existiria. Com isso, não pode haver hierarquia entre as partes que são apenas a divisão de um todo. Em função desta idéia, valorizamos a relação das partes. Uma depende da outra. Se uma não se realizar a outra também não se realizará.


Carl Gustav Jung nasceu a 26 de Julho de 1875, em Kesswil, aldeia no cantão da Turcóvia, Suíça. Seu pai, Paul Achiles Jung, exercia a função de pastor protestante. Aos quatro anos foi transferido para Klein nos arredores da Basiléia, local onde fez todos os seus estudos, inclusive o curso de medicina. Este local, na época, era um dos maiores centros culturais da Europa. Seu avô C. G. Jung foi o grande reformador da Faculdade de Medicina da Basiléia, dizia ser filho ilegítimo de Goethe o autor do Fausto, porém nada ficou provado, apesar de que Jung demonstrava prazer nesta possibilidade.


Jung foi filho único por nove anos, brigava muito com seu pai, devido a conflitos teológicos. Tinha uma relação extremamente afetiva com sua mãe.


Jung herdou de seus avos paternos conhecimentos fabulosos; seu avô era reitor da Universidade Basiléia além de Grão mestre da loja Suíça de franco-mações, casado com Sophie Frey, filha do prefeito de Basiléia e 18 anos mais jovem que ele. Seu pai, Paul Jung, era reverendo protestante, doutorado em línguas orientais, além de ser poliglota e líder maçom. Sua mãe, Emilie Jung-Priswerk, filha de pastor, muito enérgica e muito dinâmica, apesar de extremamente calma, era ligada ao ocultismo espiritualista além de ser muito inteligente.


Como o próprio Jung conta: a atmosfera em meu lar era "irrespirável".
Seu pai com um humor melancólico, frustou-se quando terminou a versão Árabe do Cântico dos Cânticos, como tese doutoral, e teve de se decidir pela carreira de pastor em uma cidadezinha rural. Para Jung, seu pai sofria de uma crise espiritual, onde sacrificou o intelecto na vã esperança de dar um apoio a sua piedade vacilante.
Nesta época, sua saúde era delicada. Fato posteriormente relacionado aos aborrecimentos domésticos.


Desde pequeno sempre se sentiu dividido em duas personalidades. A número 1, de um menino solitário, introvertido, que sentia uma enorme ansiedade por não se adaptar ao ambiente familiar e as idéias vigentes. A número 2, a de um ser muito velho e muito sábio, digno de todo respeito. Esta divisão perdurou por muitos anos. Também percebeu esta divisão em sua mãe. Onde, geralmente, agia como uma mulher extremamente boa, de um enorme calor animal, corpulenta, simpática, com grandes dons literários, bom gosto, profundidade e afeita ao diálogo. Porém, repentinamente surgia uma personalidade inconsciente e de um poder imprevisto, com um aspecto sombrio, imponente, dotada de autoridade intangível. Desta forma, Jung conclui que sua mãe também possuía duas personalidades uma humana e outra, pelo contrário, temível.


Quanto a seu pai, nunca conseguiu se comunicar profundamente com ele. Percebia que suas perguntas o entristeciam, lhe via como um homem solitário e ressentido.
Muito cedo, ainda criança, Jung entrou em contato com o mundo onírico. Com apenas 4 anos teve o seu primeiro grande sonho e, a partir deste, a cada grande sonho guardava sentimentos e imagens que o iriam marca-lo profundamente.
Desde muito jovem demonstrou um caráter contestador, com muitos pensamentos e uma enorme capacidade para a reflexão. Relata que, por volta dos 9 anos, na solidão de filho único, até então, desenvolvia este tipo de brincadeira:


“... Em frente desta parede havia uma encosta na qual ficava cravada uma pedra um pouco saliente - minha pedra. Às vezes, quando estava ‘só, sentava-me nela e então começava um jogo de pensamentos que seguia mais ou menos este curso: ‘Eu estou sentado nesta pedra. Eu, em cima, ela embaixo.’ Mas a pedra também poderia dizer ‘Eu’ e pensar: ‘Eu estou aqui, neste declive e ele está sentado em cima de mim.’- surgia então a pergunta; ‘Sou aquele que está sentado na pedra, ou sou a pedra na qual ele está sentado?’- Esta pergunta sempre me perturbava: eu me erguia, duvidava de mim mesmo, meditando a cerca se ‘quem seria o quê?’ Isto não esclarecia e minha incerteza era acompanhada pelo sentido de uma obscuridade estranha e fascinante. O fato indubitável era que essa pedra tinha uma singular relação comigo. Eu podia ficar sentado nela horas inteiras, enfeitiçado pelo enigma que ela me propunha” .


Aos 16 anos Jung começou os grandes estudos, onde percebeu que seu dilema ia se dissipando lentamente, entrou em contato com a escolástica cristã, o intelectualismo Aristotélico de São Tomás, a filosofia de Shopenhauer onde, pela primeira vez, ouviu falar dos sofrimentos do mundo de uma maneira que aquietava seus pensamentos. Esta evolução filosófica prolongou-se praticamente até o final de sua vida, principalmente quando entrou em contato com a obra de Kant e Nietzche.
Jung relata que, aos 12 anos de idade, após um incidente, em que levou um soco de outro menino e ficou atordoado. Começou a sofrer uma síncope toda vez que tentava lidar com as coisas da escola. Ficou em uma atitude de isolamento e total subversão frente ao mundo e à vida. Percebia-se como um rapaz tímido, ansioso, desconfiado, pálido, magro e de uma saúde aparentemente instável, com freqüentes desmaios, ficava envolto e inebriado com as suas inquietantes reflexões.


Seus pais o levaram a vários médicos. Nada mudou até certo dia em que Jung escutou seu pai conversando com um amigo. Ele comentava que os médicos ignoravam o que seu filho tinha e o que mais temia era a possibilidade de ser algo incurável. Questionava: o que será de meu filho? Será que ele terá capacidade de ganhar a vida? Neste momento, Jung entrou em contato com a realidade: teria de ganhar o seu sustento, um dia. A partir desse momento foi para o escritório do pai e procurou concentrar-se nos livros. Primeiramente conseguiu dez minutos e sofreu um desmaio, depois quinze... E mais trinta... E mais trinta... Até que não sobreveio mais nenhum desmaio. Assim, livrou-se de seu estado mórbido, passou a dedicar-se, diariamente, em várias horas de leitura e estudos na biblioteca de seu pai. Lia tudo o que encontrava, literatura, filosofia, história das religiões, etc.


Tornou-se então mais seguro, sentindo um grande apetite sob todos os aspectos.
Jung percorreu autores dos séculos XVII até o séc. XX. Seu pensamento permeia todos esses conceitos. Sua metodologia está livre da produção ficcional de conceitos do neoliberalismo contemporâneo. Este, só serve ao interesse da indústria da cultura que superficializa e banaliza os pensamentos. A super valorização do novo nos desvia da filosofia perene, da realidade e do presente. Por isso, Jung, sempre propôs uma revolução científica, incentivava a interdisciplinaridade, por perceber que as soluções dos problemas se encontram, geralmente, não no cerne daquela ciência, mas nas ciências afins. Só com a mudança dedo estado de consciência é que podemos superar os problemas.


Em 1900 obtém o título de médico, cuja carreira evoluiu rapidamente, em 1903 passa a ser o primeiro assistente em Burgholzli, Manicômio Cantonal e Clínica Psiquiátrica da Universidade de Zurique, neste mesmo ano casa-se com Emma Rauschenbach, com quem tem 5 filhos.
Sua tese de doutoramento foi sobre fenômenos paranormais. Em 1902, já formado em medicina e atuando como psiquiatra, apresenta uma tese de doutoramento: Sobre a Psicologia e Patologia dos Denominados Fenômenos Ocultos. Fez vários estudos sobre a demência precoce chamada, atualmente, de esquizofrenia. Trabalhou com associações verbais normais e patológicas, o que originou o teste de associação de palavras e lhe conferiu o título de cidadão “honor is causas” da Basiléia. Posteriormente, Freud adaptou para associação livre. Desenvolveu a teoria dos complexos, que são de núcleos afetivos e podem tomar a consciência de assalto.


Em 1906 estuda as obras de Freud e, no ano seguinte encontrou-se, com ele, em Viena. Neste primeiro encontro ficaram conversando ininterruptamente por 14 horas. Mas, desde o início, ficou clara a divergência de idéias que existia entre eles. Entre alguns conflitos podemos citar: Libido Sexual X Energia Psíquica; Religião X Razão; Inconsciente , como subproduto da consciência X Consciência, como evolução do inconsciente; Adaptação X Individuação. Mesmo assim, Jung foi nomeado o 1o Presidente da Sociedade Psicanalítica.
Freud e Jung tiveram um intenso relacionamento por apenas seis anos (1907 a 1913). Suas bases filosóficas e religiosas eram totalmente antagônicas. É um grande engano colocar Jung como aluno de Freud; o próprio Freud o situava como um parceiro respeitado e muito valioso, pois deu sustentação teórica a muitas de suas idéias.


A grande ruptura, entre os dois autores, se deu em função do lançamento do livro de Jung: Símbolos da Transformação da Libido, no qual Jung se distancia definitivamente do conceito freudiano de libido, como uma pulsão exclusivamente de caráter sexual. Para Jung, a libido, ou energia psíquica, se manifesta em várias instâncias do humano, indo do mais denso ao mais sutil, ou seja, do corpo à espiritualidade.
Freud via o mito no mesmo complexo nuclear da neurose. Jung, ao contrário, como funções sadias e positivas da psique, sem se ligarem, necessariamente, a impulsos sexuais ou neuróticos.


Para Freud, o sentido da vida é a aquisição de conhecimento em busca da perfeição. Para Jung, é a realização do si mesmo, que traz um sentimento de plenitude, que leva à transcendência.
Para Freud, os símbolos são restos reprimidos do passado. Para Jung são os grandes geradores de energia psíquica, que contribuem com a capacidade criativa do homem.
Para Freud, a religião é derivada do complexo de Édipo, paterno ou materno, com a sublimação do instinto sexual. Desta forma, a razão, afasta totalmente o sagrado. Para Jung, é um fenômeno universal, inerente à psique; são grandes sistemas psicoterapêuticos, que favorecem a religação com o arquétipo central, ou si mesmo.


Freud não aceitou as categorias junguianas de inconsciente coletivo, arquétipos, função transcendente, sincronicidade, capacidade simbólica e criativa da psique, entre outras. Jung tinha um enfoque muito mais voltado para o pensamento prospectivo sintético, sem desconsiderar o conhecimento redutivo causal, que era à base da análise de Freud, onde se pesquisava a origem do trauma.


Freud era um homem sem laços com a história, julgando-se inventor de conceitos e que, apesar de sua inteligência extrema, negava o conhecimento filosófico, preferindo ficar só, em sua ilha, para não correr o risco de se "contaminar" com outros pensamentos e ter a certeza de que tudo que produzia era seu. Para impor, sob a forma de dogmas, sua teoria, desconsiderando a antropologia, sociologia e a unicidade.
Jung, ao descrever a Freud um sonho que havia tido, constatou que suas diferenças ficaram muito mais evidentes. A interpretação feita por Freud contribuiu, significativamente, para que a separação acontecesse. Mas, posteriormente, este mesmo sonho, lhe possibilitou o entendimento da psique além de reativar seus interesses pela arqueologia.
Em 1913 Jung começou a estudar tudo sobre a alquimia, o que lhe abriu um campo extremamente fecundo e grande, acrescentando ao Inconsciente Pessoal a idéia de Inconsciente Coletivo.


Em 1920 escreveu os Tipos Psicológicos, onde popularizou termos com extroversão e introversão. Sua paixão em conhecer a alma humana não parou; chegou a conclusões que o levariam, cada vez mais, para o pensamento oriental, para os mecanismos auto-reguladores do Self (homeostáse), saindo do pensamento linear, indo para as ciências naturais e empíricas, sem estudos metódicos e laboratoriais, mas na observação direta dos fatos reais.
“A teoria representa, inegavelmente, o melhor escudo para proteger a insuficiência experimental ou a ignorância. As conseqüências, porém, são lamentáveis: mesquinhez, superficialidade e sectarismo científico... Pretender rotular os germes polivalentes da criança com a terminologia tirada do estágio de desenvolvimento pleno da sexualidade será, certamente, empreendimento muito duvidoso. Este proceder levará a estender a interpretação sexual a todas as outras disposições infantis; deste modo, o conceito de sexualidade se tornará demasiadamente inflado e nebuloso, enquanto que os fatores espirituais aparecerão apenas como meras deformações do espírito” .


Em 1921 passou um grande período na África depois foi visitar os índios pueblos no Arizona e Novo México. Volta à África, em 1926, para viver entre os nativos das vertentes do monte Elgon, no Quênia. Visitou a Índia e vários países Europeus além dos Estados Unidos.
Em 1922 comprou um terreno em Bollingen, constrói uma casa de dois andares, que vai sendo reformada e construída, ao longo de sua vida, conforme as suas necessidades internas. Em sua torre de Bollingen, Jung se sentia mais autenticamente ele mesmo, lá Jung dizia ser o filho "arquivo" de sua mãe, o filho do inconsciente materno, o arquivelho que habitava seu ser quando criança, o arquivo do inconsciente da humanidade. A casa de Bollingen tomou sua forma definitiva em 1955, após vários estágios de transformações.
Nesta época Jung estava com 45 anos, bem envolvido com as questões da sua metanóia, onde conclui:


"... tornou-se claro para mim que a meta do desenvolvimento psíquico é o si-mesmo. A aproximação em direção a este não é linear, mas circular... Compreender isso deu-me firmeza e progressividade, restabeleceu-se a paz interior. Atingira com a Mandala, expressão do si-mesmo, a descoberta última a que poderia chegar. Alguém poderá ir além eu não" .
A partir deste momento toda a sua vida se resumiu em elaborar tudo o que surgira durante estes anos, suas vivências internas, estudos, pesquisas, viagens enfim, o sentido era dar forma ao conteúdo que habitava no seu íntimo. Foi ao encontro com suas raízes históricas e, os estudos da alquimia foram decisivos.


Em 1928 é publicado o livro: Dialética do eu e do Inconsciente, e em 1929 em colaboração com R. Wilhelm, o livro O Segredo da Flor de Ouro. Nesta época, Jung já esta com 55 anos e em plena produção científica, suas obras vão surgindo, A Energia da Alma; Psicologia e Religião, etc.


No início de 1944, próximo dos 69 anos, fratura um pé e logo depois tem um enfarte. Durante a doença passou muito tempo acamado e teve vários sonhos e visões, que contribuíram para mais transformações em sua vida. Seu pensamento fluía, Jung disse que após a doença ele estabeleceu uma relação de "sim", incondicional ao que é, sem objeções subjetivas, aceitando as condições da existência, como as via e compreendia, aceitando o simples e escrevendo:
“... Quando seguimos o caminho da individuação, quando vivemos nossa vida; é preciso também aceitar o erro, sem o qual a vida não será completa: nada nos garante – em nenhum instante – que não possamos cair em erro mortal. Pensamos talvez que haja um caminho seguro. Ora, esse seria o caminho dos mortos. Então nada mais acontece e em caso algum acontece o que é exato. Quem segue o caminho seguro está tão bem como quem está morto...”


Jung afirma que a doença nos leva a fatos e que a psicoterapia ao bônus da doença que é o: conheça-te a ti mesmo. Os cristãos poderiam falar: reconhecer e carregar a sua própria cruz.
Em 1944 publica os livros Psicologia e Alquimia - Resposta a Jó, em 1946 A Psicologia da Transferência, em 1951 retoma a problemática de Cristo com o livro Aion, em busca do Simbolismo de si mesmo. Em 1956 o livro Mysterium Conjunctionis.
Jung conclui que suas obras são estações de sua vida, constituindo a expressão do seu desenvolvimento interior; que sua vida é a sua ação e que seu trabalho é consagrado ao espírito, sendo impossível separar um do outro.
Jung foi um viajante que se aprofundou em um terreno insólito e aterrorizador, passou pela primeira guerra Mundial, dedicou-se ainda mais em elaborar suas vivências internas e suas experiências, com estudos pesquisas e viagens, para cumprir a missão a que se sentia predestinado escrevendo:


“... Pressentira desde o início a singularidade do meu destino, o sentido da minha vida seria cumpri-lo. Isto me dava uma segurança interior que nunca pude provar a mim mesmo, mas que era provada. Não possuía esta certeza, mas ela me possuía... Ninguém conseguiu demover-me da certeza de que estava no mundo para fazer o que Deus queria e não o que eu queria..." .
Também explica como inseriu o universo mítico em sua obra:


"... Ao descrever os processos vivos da psique, deliberada e conscientemente dou preferência a um modo de pensar e de falar dramático e mitológico, porque isso não só é mais expressivo como também mais exato do que uma terminologia científica abstrata, que está acostumada a se entreter com a noção de que suas formulações teóricas poderão um belo dia ser determinadas por equações algébricas..." .


Também tece uma crítica para a atitude racionalista do homem contemporâneo, dizendo que ao negarmos o Sagrado e os deuses, passamos a ter uma atitude unilateral onde cultuamos e adoramos, monoteístamente, apenas a deusa razão:


"... O homem contemporâneo não consegue perceber que, apesar de toda sua racionalização e toda a sua eficiência, continua possuído por 'forças' além do seu controle. Seus deuses e demônios absolutamente não desaparecem; tem apenas novos nomes. E conservam-no em contato íntimo com a inquietude, apreensões vagas, complicações psicológicas, uma insaciável necessidade de pílulas, álcool, fumo, alimento e, acima de tudo com uma enorme coleção, de neuroses..." .


Jung encorajava seus alunos em abordar cada caso com um mínimo de suposições preconcebidas. Dizia, apesar de saber ser utópico e impossível, que o ideal seria não ter nenhuma suposição, e que cada analista encontre os seus próprios caminhos, dizendo:


"... Posso apenas esperar e desejar que ninguém se torne ‘junguiano’... Eu não proclamo qualquer doutrina predeterminada, e abomino os ‘partidários cegos’. Deixo todas as pessoas livres para lidar com os fatos à sua própria maneira, pois também reclamo essa liberdade para mim" .


Nestas frases percebemos o sentido Teleológico que Jung alimenta sobre a alma humana, sua dinâmica e seus fins.
Em 1957, Jung estava com 82 anos, iniciou a elaboração de sua última contribuição literária, o livro “Memórias, Sonhos e Reflexões”, que foi compilado e prefaciado por Aniela Jaffé. Em 1959, em sua casa de campo em Bollingen, desenvolvia o capítulo “Sobre a Vida depois da Morte” disse: “Algo em mim foi atingido. Formou-se um declive pelo qual me vejo forçado a descer”.


Na primavera do dia 6 de junho de 1961, com quase 86 anos, em sua casa/torre de Bollingen morreu tranqüilamente.
É significativo citar que na entrada de sua casa Jung colocou em latim os seguintes dizeres: “Chamado ou não chamado, Deus está presente”.

Algumas colocações de Jung


“A humanidade experimentou inúmeras vezes, tanto individualmente quanto como coletividade, que a consciência individual significa separação e inimizade. No indivíduo, o tempo de dissociação é tempo de doença, o mesmo acontecendo na vida dos povos. Não podemos negar que a nossa época é um tempo de dissociação e doença. As condições políticas e sociais, a fragmentação religiosa e filosófica, a arte e psicologia modernas, tudo dá a entender a mesma coisa...A palavra crise também é expressão médica que sempre designa um clímax perigoso da doença...Com a tomada da consciência, o germe da doença da dissociação plantou-se no espírito da humanidade, sendo o maior bem e o maior mal ao nosso tempo.”


“Os deuses tornaram-se doenças. Não procuramos mais os Deuses no Olimpo, nem nos antigos cultos, templos ou estátuas do passado, nem mesmo em seus dramas e narrativas míticas. Em vez disso, os Deuses aparecem em nossas desordens, particulares é claro, mas também públicas.”

“A dessacralização de nossa época tão profana é devida ao nosso desconhecimento da psique inconsciente, e ao culto exclusivo da consciência. Nossa verdadeira religião é o monoteísmo da consciência, uma possessão da consciência, que ocasiona uma negação fanática da existência de sistemas parciais autônomos..."

: “O homem perdeu o temor de Deus e pensa que tudo pode ser julgado de acordo com medidas humanas”. Esta hybris, que corresponde a uma estreiteza de consciência, é o caminho mais curto para o asilo de loucos...


...Congratulamo-nos por haver atingido um tal grau de clareza, deixando para trás todos esses deuses fantasmagóricos. Abandonamos, no entanto, apenas os espectros verbais, não os fatos psíquicos responsáveis pelo nascimento dos deuses. Ainda estamos tão possuídos pelos conteúdos psíquicos autônomos, como se estes fossem deuses. Atualmente eles são chamados: fobias, obsessões, e tornam-se doenças. Zeus não governa mais o Olimpo, mas o plexo solar e produz espécimes curiosos que visitam o consultório médico; também perturba os miolos dos políticos e jornalistas, que desencadeiam pelo mundo verdadeiras epidemias psíquicas...”


“A vida se me afigurou uma planta que extrai sua vitalidade do rizoma. O que se torna visível sobre a terra dura só um verão, depois fenece...Aparição efêmera. Quando se pensa no futuro e no desaparecimento infinito da vida e das culturas, não podemos nos furtar a uma impressão de total futilidade; mas nunca perdi o sentimento da perenidade da vida sob a eterna mudança. O que vemos é a floração – e ela desaparece. Mas o rizoma persiste.”

Waldemar Magaldi Filho

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